Mario FILIPPI, Brasil, Jubileu da Ordenação Presbiteral

Celebrando o Jubileu da minha Ordenação Presbiteral
Mario Giuseppe FILIPPI

No dia 27 de junho de 1965, na Catedral de Tento, fui ordenado presbítero por Mons. Alessandro Maria Gottardi.

No dia 28 de maio de 2015, faltando um mês para a celebração do jubileu fiz meu deserto mensal, como recomenda o regulamento da Fraternidade Sacerdotal Jesus Caritas: fiz uma Leitura Orante do Evangelho do domingo da Santíssima Trindade que estamos para celebrar e partilho algumas reflexões.

E os onze discípulos partiram para a Galiléia, para o monte que Jesus lhes tinha designado. E, quando o viram, o adoraram; mas alguns duvidaram. E, chegando-se Jesus, falou-lhes, dizendo: “É-me dado todo o poder no céu e na terra. Portanto ide, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo, ensinando-os a guardar todas as coisas que eu vos tenho mandado; e eis que eu estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos” (Mt 28,16-20).

Os 11 discípulos voltaram para a Galileia, ao monte que Jesus lhes tinha indicado. A Galileia representava para os 11 o começo daquela aventura que os tinha seduzido, fazendo com que deixassem tudo, casa, campos, lago, família, para seguir Jesus, enquanto a Judeia representava um ambiente hostil, de pessoas desconfiadas, de sacerdotes e escribas inimigos de Jesus, onde Jesus foi julgado, condenado e crucificado. A Galileia representava o começo da caminhada: era um ambiente conhecido, amigo, acolhedor, testemunha das grandes pregações de Jesus, dos milagres, das multidões que acorriam para escutar Jesus.

Voltar para a Galileia era como voltar para o entusiasmo dos primeiros tempos, como um casal idoso que, depois de ter vivido e passado por tantas dificuldades de todo tipo, fosse sentar perto da lareira, ou lá fora no alpendre, e começasse a recordar os primeiros encontros, os primeiros beijos, a alegria, o encanto do começo de sua história amorosa.

Também preciso voltar para a Galileia: daqui a um mês estarei celebrando 50 anos de ordenação presbiteral; voltar para a Galileia da minha vocação e fazer memória de tantos momentos e acontecimentos, pequenos e grandes, que fizeram com que eu deixasse minha família e o meu povoado para entrar nesta aventura que me levou tão longe. É lembrar tantas pessoas que marcaram minha existência, seja na família e na paróquia, seja nos seminários.

É fazer memória dos momentos mais significativos que alimentaram a minha fé e meu entusiasmo para tornar-me padre e para ser missionário, animando-me na caminhada, fazendo-me um dia tomar a decisão de ser padre operário, e morar durante tantos anos no meio dos pobres, para voltar à Itália e para retornar novamente ao Brasil.

Toda esta memória agradecendo ao Pai, a Jesus e ao Espírito Santo: gratidão, mas também humildade. Diz o Evangelho que Jesus se aproximou dos 11 discípulos: assim mesmo alguns duvidaram. Olhando para minha vida, estas dúvidas são as sombras, as coisas negativas, as fraquezas, a falta de fé e de confiança, as infidelidades e os pecados que marcaram toda a caminhada: esta caminhada seguindo Jesus, não foi um desfile de piedade, santidade, obediência, amor e fé, não foi uma ‘marcha triunfal’, mas foi uma caminhada às vezes arrastando os pés, desviando à direita e à esquerda, parando, tropeçando, caindo, como foi a caminhada dos que seguiam Jesus, quando discutiam pelos primeiros lugares, quando duvidavam de Jesus dormindo no barco, quando fugiram e o abandonaram.

Celebrando o jubileu da minha vida presbiteral, não posso lembrar somente o que houve de bom e de bem, mas também as muitas faltas e falhas, para poder agradecer mais ainda a misericórdia do Pai que é sempre maior onde foi grande o pecado.

Então Jesus falou: “Toda a autoridade foi dada a mim no céu e na terra”. Quem fala é o Ressuscitado. Ele já tinha manifestado a sua autoridade e o povo a reconhecia: “Este homem fala com autoridade não como os escribas”, comentavam. “Quem é este homem que fala com autoridade aos demônios e estes lhe obedecem…manda ao vento e ao mar e eles se acalmam?”.

Um dia, bem no começo da aventura, Jesus, passando na beira do lago, viu alguns pescadores e disse: “Vinde após mim, farei de vocês pescadores de homens”: falou com tanta autoridade que aqueles pescadores deixaram tudo e o seguiram.

Agora Jesus fala com a mesma autoridade e diz: “Vão, façam meus discípulos todos os povos, batizando-os…e ensinando tudo que vos ordenei”.

Estas palavras nos fazem entender que, voltar para a Galileia não significa voltar a ser pescadores, nem significa que já dá para puxar os remos para dentro do barco; voltar para a Galileia não é o fim da missão, não é poder exclamar: “missão cumprida, agora dá para se aposentar”.

Assim,para mim, voltar para a Galileia, significa começo da missão, uma missão grande, do tamanho do mundo, missão preciosa e exigente, com alegria e entusiasmo, mas também com grande humildade, porque, pela experiência destes 50 anos, as dúvidas permanecem, as faltas de fé, de fidelidade, de obediência, as tentações e os pecados permanecem.

Quando o povo de Israel celebrava o jubileu era sempre uma festa, mas a finalidade do jubileu não era só festejar: era a tentativa, o empenho, o propósito de retornar ao projeto de Deus. Deus queria que o seu povo fosse livre e feliz, mas, conhecendo a fraqueza daquele povo, que continuamente faltava aos mandamentos, ordenou que de 50 em 50 anos celebrasse o jubileu: a terra devia voltar aos antigos proprietários, para evitar o latifúndio, os escravos deviam ser libertados, pois não admissível que alguém fique escravo a vida toda, e as dívidas deviam ser perdoadas, porque não é justo que alguém fique eternamente endividado.

Portanto, para mim, voltar para a Galileia após 50 anos e celebrar o jubileu da minha ordenação presbiteral, não pode reduzir-se a festejar, mas deve ser um compromisso, um propósito renovado de doação, de amor, de generosidade, tomando para mim o que Deus disse a Jeremias: “Eu me lembro, em teu favor, do amor de tua juventude, do carinho do teu tempo de noivado, quando me seguias pelo deserto…”(Gr 2,2).

Não gostaria de escutar, dirigida a mim, a repreensão do Senhor à Igreja de Éfeso: “Tenho, porém, contra ti que deixaste o teu primeiro amor.Lembra-te, pois, de onde caíste, e arrepende-te, e pratica as primeiras obras; se não, brevemente a ti virei, e tirarei do seu lugar o teu castiçal, se não te arrependeres” (Ap 2,4-5). Peço então a Deus para que renove em mim o entusiasmo e o amor que me levou, naqueles tempos, a deixar pai, mãe, pátria e seguir Jesus…não no deserto, mas na floresta…

Mas de que jeito? Agora que estou beirando os 76 anos, de que jeito?

Jesus com toda a autoridade garante: “Eu estarei convosco todos os dias até o fim do mundo”. Não poderia haver promessa melhor, palavra mais preciosa, garantia mais confortadora.

Conto com a palavra de Jesus, conto com a sua promessa, conto com a sua presença, conto com a sua misericórdia. Assim volto para a Galileia para celebrar o jubileu e para escutar a voz de Jesus que repete: “Ide em todas as nações, fazei discípulos meus…eu estarei convosco até o fim do mundo”.

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