Os grandes mestres do silêncio. José Inácio do VALE

Quem deseja viver a experiência do glorioso silêncio é necessário conhecer a vida dos grandes mestres contemplativos.

O princípio pedagógico dessa caminhada é viver essa realidade nos retiros espirituais, numa escola de espiritualidade ou numa vocação eremítica. O deserto, o mosteiro, o eremitério, pode ser o seu coração, e o maior dos grandes mestres, o seu Mestre: Jesus de Nazaré!

Citamos alguns nomes para o início dessa JORNADA ESPLÊNDIDA: São José, patriarca da Sagrada Família; Maria, mãe do Salvador; Santo Antão, pai dos monges do deserto; São Basílio Magno, pai dos monges orientais; São João Maron, pai dos maronitas; São Bento, pai dos monges ocidentais; São Bruno, fundador dos cartuxos; São Bernardo de Claraval, abade cisterciense; Santo Tomás de Aquino, frade dominicano; Santa Gertrudes e Santa Matilde, místicas alemãs; Santa Teresa de Ávila e São João da Cruz, ambos reformadores carmelitas; São Serafim de Sarov, eremita russo; o Bem-aventurado Charles de Foucauld, eremita no Deserto do Saara; São Pio, o frade das chagas de Cristo; Santa Teresinha do Menino Jesus, religiosa carmelita; Marhe Robim, fundadora do Foyer de Charité; Dom Thomas Keating, OCSO, ex-abade trapista americano. Os tais são os grandes santos e mestres da abissal espiritualidade do silêncio.

“Nós, portanto, rodeados de uma nuvem tão grande de testemunhas, desprendemo-nos de toda carga e do pecado que nos encurralas, corramos com constância a corrida que nos espera, com os olhos fixos naquele que iniciou e realizou a fé em JESUS. Recordai vossos guias, que vos transmitiram a palavra de Deus; observando o deslanche de sua vida, imitai sua fé” (Hb 12, 1.2; 13,7). Devemos imitar a vida dos grandes heróis da fé, aqueles que viveram radicalmente ao lado do bom Deus (1 Cor 11,1).

Para meditar

O mundo vive a inflação e a usina hidrelétrica das palavras. A poluição sonora e o turbilhão da conversação causam doenças para a alma. O fechamento para o nobilíssimo silêncio é muito forte em nossa sociedade enferma. O barulho maléfico é um esquema que afasta o ser humano do silêncio espiritual e terapêutico e da plena comunhão com Deus. Com tanta zoada e imagem tem muita gente surda e cega.

O mundo vive no dilema patológico do parcial, virtual, superficial, banal, bacanal, fútil e infernal. O sistema faz o ser humano ser desconhecido, desencontrado, perturbado, enrolado, ter medo de si mesmo, ser raso, vazio e boçal. Na graça do silêncio, o encontro é inevitável! A descoberta acontece. A surpresa da revelação interior é tremenda. A pessoa passa conhecer mais sobre si mesma. Progride na sabedoria e se aprofunda nas coisas valorosas, virtuosas da espiritualidade. Busca viver uma intensa comunhão de amor com o bom Deus, com o seu semelhante e consigo mesmo.

Só no silêncio gloriosíssimo aprendemos de fato e de verdade escutar a Palavra libertadora do Criador. A voz suave e delicada do Espírito Santo faz iluminar o nosso espaço sagrado e a nossa alienação, infantilismo e mediocridade e as trevas desaparecem. Na dimensão solidária do amor silencioso, da espiritualidade solidão e da fé no Evangelho de Cristo, deixamos de ser marionetes e fantoches do sistema mundano barulhento e doentio.

No silêncio abissal
Vivo o amor celestial.
Com pureza de coração,
Vivo sem palavras falsas.
E nem pensamentos vãos.
Nesse mistério tenho,
O Senhor em minha direção.
No silêncio a essencialidade,
Na felicidade a espiritualidade.

Inácio José do Vale,
Fraternidade Sacerdotal Jesus Cáritas
Espiritualidade de Nazaré do Bem-aventurado Charles de Foucauld

PDF: OS GRANDES MESTRES DO SILÊNCIO

Irmão do meu inimigo. Aurelio SANZ BAEZA

A oficina de nosso coração tem ferramentas para manter, para reparar quando existe uma deterioração, para pôr em dia ou até para criar os bons sentimentos. Ás vezes não encontramos a ferramenta, ou estão desordenadas, ou rotas, ou precisamos de outras novas que são difíceis de conseguir. Também às vezes utilizamos a ferramenta errada, porque pensamos que é mais fácil lidar com esta. A oficina do coração pode estar avariada, com fugas, ou sem ventilação, pode ficar pequeno ou nem sempre está limpo. É provável que em certas épocas a nossa oficina tenha estado “fechada por férias”. Pela oficina do coração passam todos os dias os sentimentos danificados, as desconfianças para os outros, o orgulho ferido, o ego posto em ridículo e as decepções. Formas, cores, percepções muito diversas.

Uma vez escutei uma pessoa que me dizia: “As canas tornam-se lanças”, referindo-se á grande decepção da “nulidade amistosa” de alguém que pensava ser um grande amigo. Depois de perder a amizade pode chegar essa desconfiança, não só para com essa pessoa, mas com outras que se nos tornam suspeitosas. “O coração limpa-se, ordena-se, purifica-se. De que coisas? Das falsidades que o sujam, das dobras de hipocrisia, todos as temos, todos. São doenças que magoam o coração, que turvam a vida, fazem que seja dupla. Precisamos ser limpos de nossas falsas seguranças, que regateiam a fe em Deus com coisas que passam, com as conveniências do momento.” Papa Francisco na Missa em Erbil, Irak, 7 março 2021.

Escutamos frequentemente “nunca lhe vou perdoar isto”, “no confies em ninguém”, “pensa mal e não errarás”… Com o Evangelho nas mãos, sabendo que é um chamamento permanente à fidelidade, porque Jesus, o Mestre, o Senhor, perdoou, confiou e não teve nenhum sentimento negativo para com ninguém, não podemos aceitar como norma de vida a desconfiança, a suspeita, embora seja c ompreensível porque somos seres humanos e não robôs programados para uma conduta determinada.

Passam por nossa vida muitas pessoas, algumas ficam, outras simplesmente passam. Conforme onde estivermos e vivermos, vemos todos os dias realidades humanas diversas, algumas delas requerem nossa atenção por causa de nosso trabalho ou convívio em um lugar comum ou vizinhança, e outras realidades são externas ao nosso dia a dia mais próximo.

As áreas de conflito ou de bom entendimento são variáveis conforme a nossa psicologia, cultura, idade… Em cada um de nós existe um mundo diferente ao dos outros e por isso, diferentes modos de resolver ou superar as dificuldades de convivência, amor familiar ou comunitário, espírito de trabalho em comum ou relação de amizade.

Se nossa vida entra em conflito com uma ou várias pessoas, a oficina de nosso coração tem que produzir uma grande quantidade de respeito e de responsabilidade para nos situarmos onde devemos estar, com o diálogo possível, compreendendo as razões dos outros, sem as julgar. É melhor reparar que botar fora. E se fechamos portas, tal vez ficaremos encerrados nós mesmos dentro, com a chave fora.

Porque:

Quando cremos que nunca se vai romper uma amizade, e ela se rompe
Quando nos situamos em cima de qualquer outro
Quando nos cremos melhores que os outros
Quando na vida se tornam mais pesados os fracassos que os triunfos
Quando nos consideramos o inimigo de nós mesmos
Quando nos faz doer que haja gente que não se compromete como nós,
Quando não estamos maduros para encaixar as derrotas,

Então,

Utilizemos a ferramenta da humildade, olhemos para Jesus abandonado, ferido.

O Papa Francisco, na missa em rito caldeu na sé de São José de Bagdad o dia 6 de março de 2021 disse: “Se eu viver como pede Jesus, que coisa ganho? Não corro o risco que os outros me esmaguem? Vale a pena a proposta de Jesus? Ou é um fracasso? Não é fracasso, mas sabedoria. E a sabedoria é irmã gémea da humildade,

Se nos encontrarmos com situações nas quais, mesmo tendo perdoado e esquecido a oficina de nosso coração não consegue fazer mudanças na vida pessoal ou a daqueles que se afastaram de nossa afeição, de nossa fraternidade, de nossa amizade e confiança, do nosso acolhimento, sentiremos de novo a derrota… Não podemos mudar os outros. Aceitar a situação exige-nos um grau de maturidade que nos levará a estar em paz conosco próprios.

Quando nos consideramos “filhos pródigos” de nossos irmãos, e voltamos onde nunca deveríamos haver feito o adeus, quando a outra pessoa nos estava esperando, a oficina do coração fica livre de tralhas velhas e que não prestam, limpa das teias de aranha dos preconceitos , dando tempo ao tempo, sem vencedores nem vencidos.

Que possa ser irmão de meu inimigo, com a alegria interior, não de ter a consciência tranquila por ter feito as coisas o melhor possível, mas aquela que da a paz ao coração , que é reparado pela caridade e o amor, então brotará a alegria que indica o equilíbrio em nossos sentimentos. Um desafio, o desafio de Jesus que nos chama a perdoar setenta vezes sete e a ser perdoado outras tantas.

Aurelio SANZ BAEZA

(Tradução de Josefa FELGUERAS) (Boletín Iesus Caritas, 210)

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